Por Wagner Freire
São Paulo, 15/01/2021 – A geração eólica na região Sul tenderá a ser mais competitiva com o avanço tecnológico dos equipamentos e a precificação horária de energia – modalidade que entrou em vigor neste ano. Estados como Santa Catarina e Rio Grande do Sul deverão capturar esses potenciais novos investimentos, viabilizados através da comercialização de energia no mercado livre.
A indústria eólica tem produzido equipamentos cada vez mais potentes e eficientes em termos de produção líquida de energia renovável. Por outro lado, a precificação horária desafia geradores e comercializadores de fontes renováveis. O equilíbrio de portfólio passou a ser ainda mais importante na hora de atender as necessidades dos clientes do mercado livre.
O engenheiro e empresário Walfrido Ávila, da Tradener Comercializadora de Energia, disse que está com um projeto de 90 MW pronto para ser construído próximo a Porto Alegre (RS). “Essas máquinas novas, de 4 a 5 GW de potência, tornaram a geração eólica no Sul mais competitiva e agora com o preço horário há uma oportunidade maior. Porém, não estamos encontrando equipamentos. As fábricas eólicas estão trabalhando lotadas devido aos projetos viabilizados, principalmente, no mercado livre”, alertou Ávila.
Segundo especialistas ouvidos pelo Broadcast Energia, o fator de capacidade (FC – indicador de eficiência) das eólicas no Sul girava entorno de 20%-35%, contra valores acima de 55% do Nordeste. Atualmente, com o avanço tecnológico, o FC do Sul tem alcançado 48%.
Em 2020, a fonte eólica ficou em segundo lugar em acréscimo de capacidade ao sistema elétrico brasileiro em 2020, com 1.725,8 MW em 53 usinas, o equivalente a 34,9% do total do ano, atrás apenas da fonte térmica, com 63 usinas e 2.235,1 MW acrescidos, representando 45,3% da potência instalada no ano.
Ainda segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a capacidade instalada de geração eólica totalizou 17,1 GW ao final de 2020. A previsão é que esse mercado atinja 29,9 GW em 2024.
Atualmente, a região Nordeste concentra 80% dos parques eólicos brasileiros, segundo dados mais recentes da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica).
No entanto, os ventos no Sul são mais constantes, apesar da menor intensidade na comparação com os do Nordeste. Com o PLD horário, essa constância de vento representa previsibilidade de geração. “As eólicas no Sul geram em um período maior do dia, ao contrário do Nordeste, cuja geração maior está concentrada entre 21h e 6h, quando a demanda de energia e os preços são menores”, explicou o consultor e ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Edvaldo Santana.
Risco do negócio
O ganho ou o prejuízo na comercialização de energia pode ser comprometido se a venda e a produção ocorrerem em submercados diferentes.
Com sede em Santa Catarina, o fundador e diretor-presidente da consultoria Vilco Energias Renováveis, Sérgio Augusto Costa, reforçou também que a maioria dos consumidores do mercado livre está nos submercados Sudeste e Sul. “Com eólicas no Nordeste, sempre há o risco de submercado. Para Eólicas no Sul, o risco de submercado para clientes no Sul é zero. E para Sudeste é bem baixo, pois a curva de carga/preço entre o Sul e Sudeste é praticamente a mesma.”
Além disso, disse Costa, a situação de conexão elétrica do Rio Grande do Sul está bem encaminhada. “O famoso Lote A da Eletrosul foi relicitado e as linhas de transmissão e subestações em construção deverão ser antecipadas em até dois anos. Tem bastante margem de escoamento por vir.”
Os preços no Sul, comparado aos do Sudeste, tendem a serem maiores, uma vez que a maioria das hidrelétricas na região não tem grande capacidade de armazenamento. Em 2020, a escassez hídrica deixou o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) no Sul bem acima das demais regiões durante o ano todo.
“No geral, o investidor vê as regiões Sul e Sudeste com menores riscos de submercados”, disse o sócio de uma das principais consultorias de energia do País, em anonimato. Ele explicou, ainda, que o mercado já constatou a diferença de cerca de R$ 40,00/MWh (na média país) entre o PLD horário mínimo e máximo em janeiro. No Sul, essa diferença chega a R$ 35,00 megawatt-hora.
Com o preço horário e a expansão do mercado livre, cada vez mais os geradores precisarão equilibrar seus portfólios.
Ponta regulatória
Com o preço horário, outro fator que precisa ser considerado pelos agentes do mercado livre é a ponta “regulatória”, que ocorre entre 18h e 24h. Na ponta regulatória, a energia custa mais cara para o consumidor.
Segundo Santana, desde 2000 que o horário de maior demanda vem ocorrendo na parte da tarde, ou seja, fora da ponta regulatória. “O setor tem dificuldade de enfrentar essa discussão.”
Para ele, uma revisão na classificação do horário de ponta contribuiria para aproximar a ponta regulatória ao período de maior demanda por energia elétrica, bem como ajudaria a equilibrar melhor a carga do sistema elétrico, pois pressionaria os consumidores a deslocarem seu consumo para outros horários.
O diretor técnico da PSR – Energy Consulting and Analytics Bernardo Bezerra explicou que os estudos apontam que PLD horário, de fato, captura o horário de ponta física, ou seja, por volta das 15h.
“O que pode mudar essa dinâmica do PLD Horário é, principalmente, como vai evoluir a matriz elétrica brasileira nos próximos anos. Por exemplo, pode acontecer no futuro, pensando nos próximos 10 a 20 anos, que o PLD fique menor durante a tarde se tiver muita geração solar”, alertou.
“Considerando o perfil horário de ventos do Sul e do Nordeste, considerando o prêmio de risco (medida de competitividade), a região Sul leva vantagem sobre a região Nordeste. Os ventos na região Sul são mais comportados em termos horários e na região Nordeste têm algumas horas do dia com muita ou pouca produção”, disse Bezerra.
“O Nordeste precisaria de um prêmio de risco maior do que no Sul. Em outras palavras, para atender o mesmo contrato um gerador do Nordeste pediria um preço maior por causa desse risco de não ter vento para atender o contrato”, concluiu.